Um pesadelo para alguns ou a mágica do Direito sendo posta em prática? Para muitos, a audiência de instrução e julgamento parece peculiarmente intimidatória. Essa pode ser a primeira vez que o novo advogado ou advogada comparece em frente ao magistrado. Este momento serve para produzir prova de seu interesse ou contraditar a produção de prova da parte “adversária” dentro do processo.
Coloco adversária entre aspas, já que entendo o Processo Civil como um jogo. Jogo esse em que quem aproveita melhor suas chances consegue o resultado mais satisfatório ao seu cliente ao final da partida.
Feita esta breve introdução, vamos ao que interessa. A audiência de instrução e julgamento é a solenidade/cerimônia que serve ao colhimento dos depoimentos das testemunhas arroladas por autor e réu da ação.
Certo é que o procedimento previsto no Código de Processo Civil, em seus artigos 358 a 368, serve a um único pretexto: produzir prova oral. Ela se faz necessária pois a oitiva de testemunhas serve para delimitar os fatos controvertidos da lide. Em outras palavras, comprovar os fatos em discussão naquele Tribunal.
Serve também para que autor e réu sejam ouvidos, através do depoimento pessoal das partes, ou ainda para inquirir peritos que realizaram produção da prova técnica dentro do processo.
Aqui é preciso distinguir as demandas que podem (e devem) ser julgadas antecipadamente. Assim, é preciso considerar os princípios da economia processual, duração razoável do processo e as demandas em que a prova oral é imprescindível para o correto julgamento da causa.
Ações pautadas em farta prova documental, sem a necessidade de comprovação dos fatos por depoimento, devem ser julgadas de plano. Aquelas que versam sobre questões unicamente de Direito, e não de fato, também, conforme preceitua o artigo 355 do mesmo CPC.
A análise da imprescindibilidade da produção da prova é feita pelo juiz. Cabe a ele determinar, através de decisão suficientemente fundamentada, que o processo não necessita de outras provas para que o juiz expresse seu livre convencimento motivado.
Trazendo para a prática, uma ação indenizatória por negativação indevida dificilmente terá uma audiência de instrução e julgamento realizada. Já uma ação envolvendo acidente de trânsito exige que a prova oral dos fatos seja realizada, para que sejam atribuídas as responsabilidades pelo ato ilícito. Em outras palavras, a prova oral é fundamental para a comprovação dos fatos.
Na audiência de instrução e julgamento, o procedimento se inicia com o magistrado apregoando as partes, chamando autor e réu para a sala de audiências. No local, primeiro é tentada a conciliação entre as partes.
Toda oportunidade de unir autor e réu na mesma sala deve ser encarada como uma possibilidade para a autocomposição. Em caso de acordo, o Juiz registra em ata de audiência o combinado entre as partes, servindo o documento como minuta de acordo assinada por todos os presentes.
Caso a conciliação reste infrutífera, começam-se a serem tomados os depoimentos. Primeiro são ouvidos eventual perito nomeado pelo Juízo, depois autor e réu, caso tenha sido requerido pelas partes o depoimento pessoal.
Por fim são ouvidas as testemunhas, primeiro do autor e depois do réu. A ordem dos depoimentos consta na lei e está prevista no artigo 361 do CPC.
As testemunhas têm um papel crucial na audiência de instrução e julgamento. Afinal, são elas que fornecem informações e evidências relevantes para o caso em questão.
Essas pessoas têm conhecimento direto dos eventos, fatos ou circunstâncias relacionadas ao processo judicial e são obrigadas a dizer a verdade sob juramento. Caso contrário, podem responder criminalmente por falso testemunho.
Ou seja, é fundamental escolher bem as testemunhas que prestarão depoimento, ensaiar e praticar com elas as perguntas a serem feitas e prepará-las corretamente para o procedimento.
Aqui encontra-se momento de especial atenção ao advogado, que deve se mostrar atento para contraditar a testemunha da parte contrária. Sempre que for possível fazer prova de que:
I- A testemunha tem laços de amizade com uma das partes do processo;
II- A testemunha tem claro interesse no resultado da lide.
Especial atenção ao momento da contradita: no início do depoimento da testemunha.
É fundamental estudar o rol de testemunhas da parte contrária, investigar redes sociais, buscar por relações de parentesco ou até mesmo de emprego entre eles. Busque algo que justifique a diminuição do valor do depoimento prestado.
Quando comprovada a existência de alguma das circunstâncias mencionadas, o Magistrado tem o dever de tomar o depoimento da testemunha na condição de informante. Desse modo, a testemunha não responderá por falso testemunho caso algo que diga seja considerado inverídico ao final da instrução.
A ausência do compromisso de veracidade do depoimento da testemunha, circunstância especial às pessoas ouvidas como informante, influencia diretamente no peso que tal depoimento terá no convencimento do magistrado.
É necessário também um estudo minucioso do caso, para organizar uma linha do tempo e buscar inconsistências. Através das perguntas feitas às testemunhas, buscar versões dos fatos diferentes, horários divergentes dos informados etc. Todo esse contexto deve ser analisado para que a prova seja produzida corretamente.
Busque conhecer ao máximo a parte contrária, suas relações pessoais com as testemunhas e, principalmente, o advogado que a representa. A estratégia a ser tomada para a audiência depende diretamente desses fatores.
A preparação das testemunhas indicadas pelo advogado é crucial para o sucesso da linha do tempo e da argumentação. Portanto, o advogado deve conversar com todos que participarão da audiência para alinhar a versão dos fatos que pretende ser ressaltada naquele momento.
Em continuação, devemos sempre nos lembrar que não existe ordem de hierarquia entre os participantes da audiência. Advogados, promotores, magistrados e partes, todos devem ser tratados com urbanidade, conforme prevê a lei.
Dentro deste contexto, um ponto sensível durante a realização da audiência é o indeferimento das perguntas feitas pelo advogado. Caso aconteça, é obrigatório constar em ata o indeferimento e seus motivos para tal. Se o magistrado se recusar a registrar em ata, deve ser feita a gravação da interpelação ao magistrado. Conforme determina expressamente o artigo 367 do CPC, é autorizado às partes gravar a audiência.
Outro ponto de atenção diz respeito à possibilidade de adiamento da audiência de instrução e julgamento. Há previsão legal para tanto, no artigo 362 da Carta de Ritos Processuais, desde que justificadamente, sempre que alguma parte, procurador ou testemunha não possa comparecer.
Caso uma das testemunhas adoeça, por exemplo, e seu depoimento seja crucial para a elucidação dos fatos, a parte deve peticionar requerendo o adiamento da audiência. Para tanto, deve justificar acostando documentos que comprovem o motivo da impossibilidade de comparecimento da testemunha em audiência.
Cabe ao juiz prezar pelo livre exercício do direito de defesa e do contraditório, remarcando a audiência, já que o ato se presta a elucidar os fatos, ouvindo todos os lados do processo.
Tomados os depoimentos, o Juiz de Direito concederá 15 dias úteis para que sejam apresentados os memoriais (alegações finais), caso a questão tratada em Juízo seja complexa. Após o prazo, o processo segue para sentença.
O advogado deve ficar atento e estar preparado para debater oralmente suas razões finais, já que é possível que tal procedimento seja feito na própria audiência. Não é a praxe. A maioria dos magistrados concede prazo para alegações finais por escrito, no entanto a possibilidade do debate oral existe e o advogado deve necessariamente estar preparado.
Por fim, o presente artigo não busca esgotar o assunto. Almeja apenas servir de orientação para que os novos advogados/advogadas não se deixem intimidar pelo procedimento. Que eles estam preparados para defender suas prerrogativas e buscar a verdade dos fatos, atuando de forma coesa na defesa dos interesses de seus clientes. Afinal, conforme diz a lei, o advogado é indispensável à correta administração da justiça.
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